V
Não saberia jamais explicar o que aconteceu. Num momento os dois homens corriam em sua direção, no instante seguinte ela estava correndo nua por entre túmulos, em um cemitério mal iluminado, sem coragem de olhar para trás para saber se estava ou não sendo seguida. Sabia que aqueles homens poderiam fazer horrores com ela, ali, sozinha. O gótico era um tipo de homem que não valia o feijão que comia. Que tipo de homem abandona uma mulher nua, dentro de um cemitério tendo dois homens perseguindo-a? Xingou o gótico. Se um dia o encontrasse novamente daria-lhe um grande murro nos olhos.
Ela correu, correu sem direção, sem saber aonde estava indo, aonde iria chegar. O cemitério era enorme, confuso, ela não conseguia encontrar uma saída. E se encontrasse como sairia pelada pela rua? Em que situação fora se meter.
Quando não ouvia mais os gritos dos homens que a perseguiam foi que se atreveu a olhar para trás. Mas isso foi uma burrada muito grande, pois, sem ver, despencou dentro de um túmulo fundo e escuro.
Quando não ouvia mais os gritos dos homens que a perseguiam foi que se atreveu a olhar para trás. Mas isso foi uma burrada muito grande, pois, sem ver, despencou dentro de um túmulo fundo e escuro.
Agora estava mesmo encrencada – nua, sozinha e presa dentro de um túmulo com a perna machucada e o rosto ralado. O que ela tinha na cabeça quando se deixou conduzir por aquele louco até dentro de um cemitério?.
O túmulo era escuro com um fedor que ela não conseguia identificar mas torcia para que não fosse o de um corpo putrefato. Tentou levantar, suas pernas não aguentavam o peso do seu corpo. Seu primeiro impulso foi querer gritar, mas lembrou-se dos homens que a perseguiam e que, pelos seus gritos, poderiam localizá-la com muito facilidade. E, agora, machucada estaria indefesa diante daqueles homens. Não podia gritar, não podia nem ao menos chorar pela dor que sentia no tornozelo. E ela olhava em todas as direções daquele buraco imundo sem conseguir discernir nada. O breu era completo, não conseguia nem ao menos ver as pontas dos seus dedos. Só quando olhou pra cima e viu o céu estrelado é que pôde deduzir que estava dentro de um buraco bem fundo.
Indefesa, sozinha, nua e completamente apavorada, ela viu o tempo passar lentamente. Sem celular, sem relógio não fazia a menor ideia de que horas seria. Como poderia sair dali em segurança e sem passar por uma vergonha maior? Quando o dia amanhecesse estava certa de que teria ajuda, mas, também, teria que explicar o que estava fazendo dentro de um túmulo completamente nua. Podia ver a imprensa reunida tirando fotos e mais fotos. As manchetes dos jornais trariam-na na primeira página “Jovem é encontrada nua dentro de túmulo no cemitério”, ou pior, um jornal sensacionalista “Foi dar uma e caiu em buraco no cemitério”. Viu sua mãe arrancando o seu coro, não ficaria contente em dar-lhe um sermão. E quando sua mãe contasse isso ao seu pai? Ele ficaria possesso. Podia ver o Seu Alfredo com as veias do pescoço saltadas, as mãos tirando a cinta e ela chorando por um dia inteiro.
Como pudera ter sido tão inocente e ter se enfiado numa situação como aquela? Pelo menos dentro do buraco não seria localizada pelos dois homens. Encostou-se num canto do vasto túmulo, agachou-se e abraçou as próprias pernas. Sentiu sua bunda gelada em contato com o chão de terra úmida. O que era aquele túmulo? Imaginou os vermes saindo de todos os lados pensando que ela seria mais um corpo a ser devorado. Que aflição! Começou a chorar baixinho de tanto medo. Prometeu a si mesmo, depois dessa, viraria freira ou coisa parecida, nunca mais iria querer saber de homem.
De repente ouviu o barulho de passos. Ficou atenta. Poderia ser o gótico vampiro, mas também poderia ser um dos homens ou os dois. O melhor a fazer era ficar quietinha encolhida em seu canto e rezando para ninguém a encontrar, o que era contraditório, pois o que mais queria era sair daquele buraco, daquele lugar e nunca mais voltar. Ouviu os passos se aproximando do túmulo e sentiu um pouco de terra sobre a sua cabeça, viu uma sombra se interpor entre ela e o céu estrelado. Sabia, se ela não podia vê-lo senão como um borrão, ele tampouco poderia vê-la. Tentou não mexer um só músculo do seu corpo com medo de ser localizada. A sombra certamente estava olhando para dentro do buraco na tentativa de saber se havia alguma chance de ela estar lá dentro, mas não vendo nada alem do breu, volveu os passos e afastou-se.
Tentou levantar-se. Conseguiu, com muito esforço. Será que conseguiria pular e alcançar a beirada do buraco, agarrar-se e sair dali? O buraco tinha quase três metros de altura e com a perna machucada ela não seria capaz de pular tão alto. Torceu para que nada mais acontecesse ou ela não seria capaz de aguentar, teria que se entregar ao desespero. Torceu para que o sol chegasse logo, embora não conseguisse saber se seria bom ou ruim. Por fim conseguiu fechar os olhos por alguns segundos.
Quando os abriu, o céu se mesclava de luzes. O dia não tardaria a chegar.
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