III
Seus monstros, despertados, gritavam em seus ouvidos. O último pedaço do mundo aonde não queria estar. Desde pequena morria de medo à simples menção daquele lugar e ali estava ela, numa noite de sábado, ao lado de um homem que nem ao menos sabia o nome. Era demais para a sua cabeça. Teve ímpeto de se levantar e sair correndo apavorada, transtornada. Nunca sentiu tanto medo como naquele momento. O ar lhe faltava nos pulmões, sua cabeça girava. A figura daquele gótico a sua frente parecia completar o cenário de terror onde se encontrava. Olhou em volta e constatou que era real – ela estava dentro de um cemitério, cercada por túmulos e aquele cheiro, que agora sabia, era o de vela queimada, o cheiro das flores era apavorante. Levantou-se do túmulo onde houvera sentado e tentou tomar um rumo que a levasse para bem longe daquele lugar. Tinha verdadeiro pavor de cemitério, desde criança não entrava em cemitério, desde a morte de sua avó. Ir parar ali naquela noite era algo que realmente a fizera constatar a besteira que fizera confiando num estranho maquiado e de roupa preta.
- Você é maluco? Um cemitério. Num cemitério é demais para mim. Para que lado fica a saída eu vou embora.
- Desencana, nada aqui pode lhe fazer mal, garanto que estão todos mortos e enterrados – disse ele com seu humor negro.
- Eu quero sair agora, por favor.
O gótico puxou-a fazendo que se sentasse novamente, mas ela queria sair dali, queria estar o mais longe possível de um cenário como aquele.
- Desencana, mina, pare com a histeria.
Ela tentava se acalmar, mas parecia impossível tendo a sua frente um mundo de túmulos mal iluminados por uma luz fraca que vinha de um poste mais a frente. As sombras desenhavam monstros tenebrosos em sua mente, temia que, de uma hora para outra, um defunto levantasse de seu túmulo e viesse pegá-la. Lembrou-se de suas noites insone com medo de ser pega por algum tipo de ser gosmento, medonho e tenebroso com fome fora do normal pela carne humana. Pensando em seus monstros não percebeu a tentativa frustrada do gótico em deixá-la excitada, beijando-lhe de todas as formas, segurando-lhe o rosto, tentando chamar mais atenção do que os monstros que ele não via.
- Relaxa, estamos aqui, vamos aproveitar. Esse lugar é apenas um depósito para sonhos perdidos, vidas vividas com ou sem intensidade, apenas um depósito esquecido onde só há lixo. Não há nada aqui que possa lhe fazer mal.
Foi quando Nusa olhou a sua frente e conseguiu ver além dos seus medos. O gótico maluco pusera uma grande toalha no chão. Dispostas sobre ela uma garrafa de vinho, duas taças e algum tipo de petisco tão estranho quanto ele. Ela não podia acreditar que aquele maluco estava mesmo pensando que poderia ter alguma coisa com uma mulher normal num lugar como aquele, não, não era possível. Por mais que tentasse ou quisesse esquecer-se de que estava num cemitério, os túmulos faziam dança em sua cabeça e não lhe deixavam tempo suficiente para aproveitar a oportunidade de fazer algo maluco com aquele gótico. Agora vinha à sua mente que sempre lhe disseram que aquele tipo de gente era assíduos frequentadores de cemitérios e coisas apavorantes similares, criavam cobras, aranhas e tinham morcegos em gaiolas como as pessoas normais criam seus canários.
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