IX
Eu não poderia ter continuado ali. Levantei-me, entrei em meu carro e parti, sem nem ao menos me despedir do Tio Ângelo que deveria estar rindo da minha cara de otário. Fui pela estrada vagarosamente temendo e, ao mesmo tempo, querendo encontrar aquele gol preto que levara Manuela. Era provável que não houvessem ido a um motel e sim a algum lugar mais reservado entre aquele matagal que cercava a região. E deu certo que os encontrei uns dois quilômetros a frente, parados diante de uma represa, ao lado da estrada. O carro estava com os vidros fechados e aparentemente não havia ninguém por perto, Mas meu coração partido sabia que naquele momento, dentro daquele carro, o priminho estava se refestelando sobre o corpinho de Manuela que na noite anterior havia sido meu.
Parei o meu carro mais a frente, de onde eu poderia ver sem ser visto por ela. Eles demoraram a sair do carro e quando saíram ela ainda estava de biquíni. O lugar era bem deserto, o que deve ter atiçado a sua perversão. Ele encostou-a contra o capô do carro e traçou-a ali mesmo. Eu me continha para não ir lá e socar aquele cara, dar uma surra em Manuela e levá-la embora para minha casa, ou para qualquer lugar do mundo onde eu pudesse ficar com ela. Eu a odiava e a amava ao mesmo tempo, eu queria matá-la e amá-la pelo resto de minha vida. E era incrível, naquele momento, eu podia perceber o quanto estava apaixonado por ela, eu estava de quatro por aquela safada. Em determinado momento tive a impressão de que ela havia me visto e, por isso mesmo, se exibido mais, mas não sei, poderia ter sido somente uma impressão. Entrei no meu carro e fui embora eu não podia continuar me martirizando de ciúmes vendo aquela cena que me agredia. E com dor de corno cheguei em casa. Fui direto para o meu quarto, tranquei-me durante todo o restante daquela tarde. Como é sofrida a vida de corno!
Naquela noite, antes do jantar meu celular tocou. Olhei o número e não conheci, pensei em não atender, poderia ser Olga querendo tripudiar sobre mim, ou, pior, querendo que eu fosse à sua casa novamente para ser um pouco mais humilhado. Por fim, resolvi atender.
- Pedro –disse-me uma voz que prontamente eu reconheci. Era Manuela.
- Sim.
- Pedro, porque foi embora da festa e me deixou?
- Por quê? Porque você é uma safada e foi dar para outro bem debaixo do meu nariz.
- E?
- E o quê? Você não podia ter feito aquilo comigo, não podia...
- Engraçado, você fica desfilando com minha mãe para cima e para baixo e quer me cobrar fidelidade. Nós só transamos uma vez, só isso, agora se você estava pensando em algo diferente disso, desculpe-me, mas a história só existe em sua cabeça.
- Está certo – disse eu sabendo que infelizmente ela estava certa, eu não podia cobrar-lhe nada, afinal não tínhamos nada. Mas a imagem dela de esbaldando com aquele seu primo me martirizava demais. – Eu fiquei com ciúmes, eu vi você e aquele cara perto da represa se divertindo.
- Aquilo não foi nada, meu primo e eu, de vez em quando aprontamos uma daquelas, simplesmente para quebrar o marasmo, ele e eu estávamos sem ninguém mesmo.
- Eu estava lá – retruquei.
- Mas não estava comigo, estava com minha mãe.
- Fica comigo essa noite – pedi.
- Venha me buscar, estou na portaria esperando-o.
- Estarei aí em meia hora.
Desliguei o celular, fui tomar banho, coloquei uma roupa e ia saindo quando meu celular tocou novamente. Era Olga.
- Pedro, venha aqui em casa, precisamos conversar.
- Não posso. E não temos mais nada para conversa. Está tudo acabado entre nós...
- Por que, por causa de Manuela?
- É – disse eu corajosamente.
- Você não pode fazer isso comigo, não dessa forma.
- Desculpe-me, mas a vida é cheia de imprevistos.
- Você é um cafajeste, filho da puta.
- Não precisa ofender minha mãe – respondi quase sarcástico.
- Vai se foder, seu filho da puta - gritou ela ao telefone alto o suficiente para que minha mãe pudesse ouvir. – Você não vai ficar com ela, ouviu?
E desligou o telefone na minha cara.
- Terminou mais um relacionamento, Pedro?
Encarei minha mãe, mas não disse nada.
- Por que será que o primeiro palavrão sempre tem a ver com a mãe do dito cidadão? Como se eu fosse culpada por você ser tão safado.
- Mãe, não enche, faça o favor.
- O que você aprontou dessa vez?
- Nada –disse eu saindo.
Parei o carro na frente do prédio de Olga e esperei Manuela por horas. Ela não apareceu. Será que Olga havia dado um jeito de acabar com o meu relacionamento com ela antes mesmo de ele começar? Preocupou-me aquela situação. Peguei o celular e liguei para Manuela. Chamou mais de dez vezes até cair a ligação. Tentei novamente. A secretária eletrônica disse que o telefone estava impossibilitado de receber ligações naquele momento. Droga! Será que Olga houvera convencido sua filha a não me encontrar. Desci do carro e fui até a portaria.
- Oi, Alceu – disse eu para o porteiro que já me conhecia.
- Pedro? Não sei o que aconteceu, mas recebi ordens de Dona Olga para não deixá-lo subir ao seu apartamento nem por decreto judicial.
- Você viu a Manuela hoje?
- Não, senhor. Não a vejo desde ontem.
- Droga! Tente telefonar ao apartamento de Olga, diga-lhe que quero lhe falar.
- Não acho uma boa ideia, Pedro. Você não viu a cara dela quando me mandou barrá-lo na portaria.
- Por favor, pelo menos tente.
Ele pegou o seu telefone.
- Dona Olga, Pedro está aqui querendo falar com a senhora. Sim, senhora. Entendi. Tudo bem. – desligou o telefone e me encarou. - Ela disse que é para o senhor desaparecer e nunca mais passar nem na frente desse prédio e que, se tornar a aparecer aqui, ela chamará a polícia.
- Essa mulher é louca!
- Louca ou não, o senhor me perdoe, mas se aparecer aqui novamente serei obrigado a chamar a Polícia, afinal é ela quem paga o meu salário.
- Entendo, Alceu.
Saí de lá mais preocupado ainda com o que poderia ter acontecido para Manuela acatar assim as ordens da mãe, afinal ela não parecia o tipo de filha que dá ouvido ao que a mãe manda. Voltei para casa e naquela mesma noite tentei ligar novamente. Mas como da vez anterior o celular não estava disponível. Cansei, se ela queria dar atenção às ordens de sua mãe ela que se danasse com sua mãe para lá. Eu é que não iria ficar correndo atrás de uma mulher como aquela. Fui dormir.
No dia seguinte, porém, tudo mudaria. Despertei com o barulho de uma mensagem em meu celular. Peguei o celular para ver quem era o filho da mãe que estava me enviando uma mensagem às seis horas da manhã. Abri a mensagem, era de Manuela.
SOS – estava escrito
Amanhã tem mais
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